Entenda como a doença celíaca pode afetar o seu bebê durante a gravidez
(Artigo publicado na mídia de Portugal ― mantivemos a gramática nativa do texto original)
A doença celíaca afeta entre 1 e 3% dos portugueses, estando 10 mil casos referenciados, mas os especialistas consideram que a patologia está subdiagnosticada já que poderão existir cerca de 100 mil celíacos “anónimos”. O problema afeta, na maioria, crianças e jovens, e são muitas as mulheres em idade fértil que pretendem conciliar esta doença com o desejo de engravidar.
A intolerância ao glúten implica riscos específicos para a futura mãe e o futuro bebé? A intolerância ao glúten é uma condição que requer análises, controles adicionais e tratamentos? A doença celíaca é hereditária? Existe algum modo de reduzir as probabilidades de a mulher transmitir a intolerância ao seu bebé?
Causas da doença celíaca
Mais do que uma doença, é uma condição. Por isso, assim que se elimina da alimentação o glúten, que é a origem de todos os problemas de que sofrem os celíacos, o seu estado de saúde é igual ao de uma pessoa não celíaca.
As origens desta condição são, em grande parte, hereditárias: os filhos de pais celíacos têm sérias probabilidades, aproximadamente 10%, de vir a manifestar intolerância ao glúten. No entanto, a herança apenas diz respeito à predisposição genética para o organismo rejeitar o glúten. Outros fatores, ainda pouco conhecidos, contribuem para o aparecimento do problema, demonstrado pelo facto de que um grande número de pessoas celíacas manifesta os primeiros sintomas na idade adulta, e até na terceira idade, depois de ter consumido glúten durante toda a vida sem sofrer efeitos nocivos
Sintomas da doença celíaca
Em contacto com a mucosa intestinal de uma pessoa celíaca, o glúten, ou mais exatamente um dos seus componentes chamado gliadina, estimula uma reação inadequada dos linfócitos T- células do sistema imunitário que libertam moléculas de ação inflamatória. A longo prazo, o processo inflamatório danifica as vilosidades intestinais. A primeira consequência é uma má absorção, ou seja, a funcionalidade reduzida da mucosa intestinal, que não é capaz de absorver adequadamente as substâncias nutritivas contidas nos alimentos.
A má absorção de cálcio e ferro traduz-se no aumento do risco de osteoporose e anemia. Nos casos mais sérios, a funcionalidade reduzida do intestino manifesta-se através de perda progressiva de peso, diarreia e dores abdominais. Com o tempo, se a doença celíaca não for diagnosticada, e portanto o glúten não for eliminado da alimentação do paciente, os danos da mucosa intestinal podem favorecer o aparecimento de tumores.
Filhos de mulheres celíacas que tomam glúten durante a gravidez correm um maior risco de nascer prematuramente”
Tratamento da doença celíaca
Atualmente não existe um tratamento para este problema no sentido em que não existe nenhum fármaco que cure a intolerância ao glúten. Uma pessoa celíaca é-o para toda a vida, no entanto, os efeitos negativos desta doença podem ser anulados através de uma dieta sem glúten. Em pouco tempo, os danos da mucosa intestinal revertem e o intestino recupera por completo a sua funcionalidade.
Quais os alimentos que contêm glúten
O glúten é uma proteína presente em cereais como o trigo, a cevada, o centeio e a espelta. Como tal, a dieta dos celíacos deve excluir todos os alimentos que contenham estes cereais, mesmo que em pequenas quantidades. Para além dos alimentos claramente proibidos, como pão, pizza, bolachas, bolos e massas obtidas com estes cereais, é necessário ter em conta outros alimentos de risco menos evidente. São eles: carne e peixe panados, molhos e batidos que levem farinha, almôndegas e hambúrgueres, enchidos, purés de carne ou peixe, pratos pré-cozinhados à base de carne ou peixe, cremes, pudins e sobremesas embaladas, sopas, verduras fritas panadas, gelados, derivados de café e bebidas à base de leite, para referir, alguns dos alimentos mais comuns que contêm os cereais proibidos como aditivo.
O arroz, o milho, a espelta, a aveia e o trigo-sarraceno não contêm glúten e, portanto, podem ser consumidos pelos celíacos, não obstante, por vezes os alimentos à base destes cereais estão contaminados com pequenas quantidades desta proteína na fase de preparação.
Perante a dúvida, a escolha mais segura é a dos alimentos que tenham a etiqueta de “sem glúten”, já que estes produtos passam por um rigoroso processo de fiscalização exigido por lei. Hoje em dia, é cada vez mais fácil encontrá-los à venda, seja em supermercados, lojas especializadas ou farmácias. Além do mais, graças aos esforços das associações de celíacos, o número de restaurantes com carta de pratos específicos para celíacos é cada vez maior.
Existem diversas abordagens terapêuticas em estudo com o objetivo de curar a doença celíaca e libertar os pacientes do incómodo da alimentação sem glúten; mas, por agora, são apenas aproximações experimentais. A dieta de exclusão de glúten é, por agora, o único tratamento com eficácia comprovada.
Como se trata de uma condição de elevado componente hereditário, a doença celíaca pode ser transmitida da mãe para o filho como parte da herança genética”
De que modo a doença celíaca influi na gravidez?
A fertilidade não se vê afetada de nenhum modo pela doença celíaca e não há riscos específicos desta doença no período da gravidez. É a intolerância não diagnosticada que representa uma ameaça para as mulheres celíacas que esperam um bebé. A má absorção de substâncias nutritivas no período anterior à conceção e durante os meses de gravidez, pode causar grave carência de cálcio, ferro e ácido fólico, e o seu consequente aumento de risco de malformações do tubo neural, de problemas de desenvolvimento ósseo do bebé e anemia. Além disso, os filhos de mulheres celíacas que tomam glúten durante a gravidez correm um maior risco de nascer prematuramente.
Por outro lado, um estudo realizado pelos investigadores do Policlínico Gemelli, na Itália, e publicado recentemente no American Journal of Gastroenterology, salienta que as mulheres celíacas que não seguem uma dieta com ausência de glúten correm um risco triplicado de sofrer aborto espontâneo durante as primeiras semanas de gravidez. Parece ser que a reação imunitária, estimulada pelo contacto do glúten com a mucosa intestinal, inibe a capacidade de o embrião se estabelecer e implantar nas paredes do útero. A única medida preventiva capaz de reduzir o risco de aborto espontâneo é eliminando qualquer vestígio de glúten da alimentação durante pelo menos seis meses antes da conceção. O objetivo desta medida é o de anular a presença de anticorpos anómalos na corrente sanguínea.
Se o diagnóstico for feito durante a gravidez, cabe ao médico a tarefa de controlar se a má absorção ocasionou carência de ferro ou cálcio”
Medidas a tomar
É importante que as mulheres que estão a tentar engravidar e suspeitam de intolerância ao glúten, ou aquelas que tenham parentes de primeiro grau com doença celíaca, falem com o seu médico de família e se dirijam a um centro especializado no diagnóstico da doença celíaca. No caso de obter um resultado positivo, seguindo uma dieta rigorosamente sem glúten, não correm nenhum risco particular nem necessita efetuar controles adicionais ou tratamentos farmacológicos durante a gravidez. Se o diagnóstico for feito durante a gravidez, cabe ao médico a tarefa de controlar se a má absorção ocasionou carência de ferro ou cálcio, e se for necessário prescrever suplementos destes minerais. O mesmo é válido para o diagnóstico obtido após o parto, no puerpério ou durante a amamentação.
Como se trata de uma condição de elevado componente hereditário, a doença celíaca pode ser transmitida da mãe para o filho como parte da herança genética. A criança corre o risco de desenvolver a doença ao longo da sua vida em cerca de 10%. Até hoje ainda não foram claramente identificados quais os comportamentos ou precauções a tomar durante a gravidez, ou após o nascimento do bebé, de modo a reduzir a probabilidade de desenvolver intolerância ao glúten. Pensa-se que ao atrasar, o mais possível, a exposição do bebé ao glúten, o seu organismo desenvolve um efeito protetor, mas estes estudos ainda não apresentaram resultados definitivos.
Diagnóstico da doença celíaca
A que se deve o aumento de diagnósticos de doença celíaca nos últimos anos? Os casos de intolerância ao glúten estão realmente a aumentar entre a população? Numa pequena parte dos casos parece ser que sim, embora as razões permaneçam desconhecidas. No entanto, uma grande parte deste aumento deve-se a um maior conhecimento desta condição e ao facto de que hoje em dia haja um número crescente de pessoas atentas aos sintomas da doença, que consultam o médico e efetuam os testes necessários. Para diagnosticar a doença celíaca é preciso seguir um protocolo bastante preciso, que inclui uma análise de sangue, uma gastroscopia e uma biopsia da mucosa intestinal, que devem decorrer num hospital especializado e credenciado.
Fonte: O Meu Bebê | Foto: José Gabriel Lugo/Visualhunt/CCBY-NC-SA